Sessão de Estudo Particular
Entre Pares

Finos pingentes de gelo se formavam das goteiras enquanto a garota se concentrava.

Para remover energia de uma partícula, evitando que sua energia cinética se dissipe pela vizinhança, ela precisava perder energia como luz. Na natureza, isso só acontece em um estado em que a partícula já tem muita energia cinética e seus elétrons começam a pular entre suas camadas em uma dança de probabilidade quântica.

Infelizmente para ela, todos os materiais de sua futura prova estariam em temperatura ambiente. Resfriar um carvão em brasa já era algo que ela fazia brincando, mas para se formar de aclita para pesquisadora, ela precisava demonstrar compreensão e domínio sobre as várias dimensões em que magia poderia afetar a matéria. Redirecionar energia cinética para eletrônica era uma dessas, e outra era irradiar essa energia em forma de luz.

Converter os infravermelhos em luz visível era outro passo necessrio para evitar o aquecimento do sistema em que é inserido, mas era algo que ela teria de praticar depois, após dominar os passos anteriores.

Foi tirada de seu transe por uma sequência de fortes batidas em sua porta:

"Juliette! Tem um jovem chamando você lá fora!" - "Já vou, vó!"

Até então ela não tinha percebido as queimaduras de frio nas pontas de seus dedos. Ela soprou bafo quente nas mãos e então pegou seu manto, saiu e foi confrontada por sua avó antes de chegar às escadas.

"Ele é aquele que sua prima falou? Ele parece muito magro, mas bonitão... "

"Minha prima O QUÊ?"

"Você sabe que é a última da sua leva a encontrar companhia, estamos tudo torcendo por você"

"Vó, o Harry não é meu namorado... e estamos quase atrasados para a sessão de estudo!"

"Oh, minha querida, ele parece um bom rapaz... que Sol ilumine seu caminho! Vou fazer janta!"

Ela s olha rápido para sua avó, se indagando quando que ela começou a acreditar nessas coisas. Ela se apressou para encontrar seu colega acólito esperando em sua porta.

"Desculpe por estar atrasada, Harry, vó achou que estávamos namorando"

"Oh, ei Julie ... não tem problema ... como voc está hoje?"- Em sua pressa, Julietta nem percebeu bochechas coradas de Harry.

"Ainda estou tendo problemas pra manter clareza enquanto mergulho por múltiplos canais dimensionais ao mesmo tempo. Posso trabalhar por conta de forças nucleares, eletrônicas ou gravitacionais, mas quando preciso dividir a atenção, perco o controle de tudo."

"Oh..." - Não era a resposta que ele esperava. Até pensar em algo, Juliette já tinha voltado a falar.

"Precisamos chegar s portas da universidade antes do toque de recolher, se não quisermos problemas com ‘Seu Santo Brilho’" - Ela disse a última parte em tom jocoso, e puxou seu capuz sobre a cabeça antes de acelerar o passo. Eles chegaram à universidade em vinte minutos de silêncio e agilidade.

Não que eles estivessem fazendo algo errado, mas a universidade teve a maior parte de suas atividades interrompidas pelo conselho municipal. Ensino de Heresias, eram as acusações do novo Pontífice do Templo de Sol.

Entrar furtivamente no campus era fácil, pois haviam muitas entradas secundárias, mas eles tinham que tomar cuidado para não chamar atenção para si mesmos, e para onde estavam indo.

O labirinto de prédios construídos ao longo de sculos por diferentes culturas e arquiteturas tornava a tarefa mais fácil. O destino deles era uma sala nos subterrâneos da Velha Biblioteca, atrás de corredores de velhos registros da burocracia e funcionamento interno da universidade.

Eles foram os últimos a chegar, e as expressões dos colegas mostravam uma mistura de medo e alívio. "Ninguém os seguiu até aqui, certo?", perguntou um deles.

"A última vez que notamos alguém conosco foi perto da entrada. Viemos sozinhos" disse Juliette com confiana, Harry confirmando com a cabeça.

A pesada porta de madeira foi fechada e eles cumprimentaram silenciosamente todos na sala. Com sua chegada, os alunos eram oito, mais o Professor, que já havia anotado algumas frmulas no quadro.

O Professor, um meio-Fae careca, esperou que os dois se sentassem aprontassem. "Na nossa última reunião revisamos as frmulas básicas que traduzem o movimento de corpos massivos pelo vácuo, sua atração mútua, desde limites planetários locais até aglomerados interestelares. Na leitura de referência que vocês levaram para casa, o autor nos ajuda a concluir que podemos extrapolar essas mesmas regras para distâncias e massas ainda maiores, até atração e fusão galáctica. O mecanismo quântico por trás dessas forças não é algo que vocês devem se preocupar nos primeiros graus de pesquisador."

Ele virou as costas para a turma e começou a escrever fórmulas no quadro.

"Este cenário hipottico foi explorado nos exames de graduação de acólitos pelo menos três vezes no último século: um objeto massivo O* atravessa área de influência de uma estrela. Sua passagem foi rápida, mas O* pesado o suficiente para descolar pedras de todos os tamanhos de suas órbitas estáveis. Com os dados do sistema dado, vetores de movimento inicial dos corpos principais, nossa tarefa é calcular os trajetos resultantes e possíveis resultados, incluindo possveis colisões futuras ou uma lua sendo arremessada para fora de um sistema planetário. Podemos começar a resolver o problema encontrando o vetor de atração média exercido por O* através de sua trajetória..."

Os Acólitos estavam em completo silêncio. Eles não estavam aqui esta noite para fazer perguntas, mas para assistir um profissional fazer seu trabalho. Todos vieram preparados.

Meia hora depois, o professor de repente parou. O meio-Fae foi o primeiro a notar rudos sutis do lado de fora da porta. Harry se levantou na surdina e ficou ao lado da porta fechada, tentando escutar algo. Alguns segundos depois, seu corpo voou com violência para o centro da sala, seguido por uma figura colossal invadindo a sala através de pedaços de madeira quebrada - um caça-magos de Sol.

"Eu disse que havia algo acontecendo aqui!"

Exclamou com alegria o caça-magos, encantado com o medo nos olhos dos jovens aclitos.

"Você estava certo, de fato algo sombrio está acontecendo aqui", disse um homem meia-idade que entrou na sala logo em seguida, tinha um corpo gordo, vestido em roupas vermelhas e douradas, seguido por uma tropa de soldados nas cores do Sol.

"Não há motivo para violência, brilhante sacerdote! Nenhum crime está sendo cometido neste lugar!", disse o professor, de pé entre o caça-magos e um tonto Harry, que tentava entender o que estava acontecendo.

"Aulas etsão proibidas, vocês não ouviram?"

"Não estamos tendo uma aula para o público em geral, mas uma sessão fechada entre pesquisadores, não me lembro destas terem sido proibidas."

O sacerdote fingiu não ter ouvido. Todos ficaram parados enquanto ele se aproximava do quadro e lia seu contedo.

"Magia Gravitacional é uma das Heresias Proibidas!", exclamou em acusaço.

"Desculpe, sacerdote, mas você está errado!", rebateu o professor. "Durante a XXXVII reunião dos Reinos do Continente Oriental, foi declarado que apenas a magia e os estudos relacionados a Buracos Negros deveriam ser banidos da academia!"

"No entanto, os Fundamentos para Magia de Buracos Negros são os estudos da gravidade e da cosmologia. Eu estou errado?"

"Devemos evitar uma segunda tragédia, mas a cosmologia pode ser pesquisada em ambientes seguros, até mesmo usada para proteger nosso planeta!"

"Ainda assim, isso é muito perigoso para estar acontecendo sem supervisão. O uso da magia s é permitido sob a orientação de Sol. Todos vocês devem ser detidos e questionados por suspeita de Atividades Heréticas."

Música para os ouvidos do caça-magos. O homem sádico no se importava com o professor, que estava argumentando com o sacerdote, em vez disso, procurava pela sala por um brinquedo mais interessante. Ele começou a se aproximar de Juliette, mas foi atacado por um Harry renovado, que o agarrou e gritou "Não encosta um nela!".

A maioria dos acólitos estava muito chocada para fazer qualquer coisa. Para o caça-magos, isso era um dia de trabalho comum, e ele não gostava que seu espaço pessoal fosse violado. O homem largou sua faca menor cravada no abdômen de Harry, e voltou-se para o alvo anterior.

Juliette não podia acreditar no que estava vendo. Em menos de dois minutos, sua realidade havia mudado abruptamente de uma sessão de estudos focada, para assistir ao seu melhor amigo sendo fatalmente ferido. Seu corpo se recusava a se mover.

Os soldados começaram a se aproximar dos aclitos quando o professor os acordou com um grito: "Pela saída de trás! Rápido!". Dois dos estudantes se uniram para forçar uma abertura por uma empoeirada estante de livros num canto da sala, enquanto o professor se defendia de seus alunos.

Ele nunca foi um homem de violência, mas devido à natureza variada de seus estudos, não havia um único pesquisador veterano incapaz de criar uma situação perigosa’ com sua magia. Do bolso de sua camisa, ele tirou um pequeno cristal vermelho, Pedra-Brilho. Esmagou o cristal com as palmas das mãos, e a partir de seus fragmentos uma explosão de chamas se expandiu, engolindo metade da sala.

O plasma brilhante obrigou Juliette a fechar os olhos, e o segundo que levou para ela abri-los de novo foi o suficiente para o caça-magos cruzar as chamas e brandis sua espada em direão ao Professor. A fonte das chamas se extinguia enquanto a mo esquerda do professor caía no chão. O meio-Fae chocado não conseguiu reagir a tempo do soco que o caça-magos lançou em sequência, derrubando-o.

Os soldados e sacerdote estavam tentando apagar as chamas de suas roupas, e o caça-magos reclamou da diverso ter acabado tão rápido. Juliette estava deitada no chão e sua expressão de presa em desespero não era a sobremesa que o caça-magos procurava. Acabou a brincadeira, agora era só questão de limpar a confusão. Ela não conseguia mover um músculo enquanto o homem se aproximava, mas sua mente estava focada em visualizar os átomos de água presentes no ar.

“Redirecionar e Irradiar Redirecionar e Irradiar Redirecionar e Irradiar…”

Sua pele já estava quente por conta das chamas, ento não se importou com a radiaão infravermelha adicional que a envolvia. Menos um passo a se preocupar, e sem qualquer antecipaço, uma rajada de luz congelante varreu o aposento.

Ficar cega duas vezes seguidas não era algo que ela gostava, mas como desta vez foi de seu próprio feitio, se forçou a aguentar. Uma paliçada de cristais de água congelada se ergueu diante dela, bloqueando soldados contra as paredes e imobilizando o caça-magos da cintura para baixo. O ar estava to quente que todos suavam.

Ele não estava com raiva. Seu rosto era do mais puro fascínio. Finalmente encontrou uma presa digna de sua fome.

"Sem encantamentos orais... sem movimentos de auxlio, e nem mesmo o uso de Pedra-Brilho... você é uma natural!"

Juliette não via os comentários dele como um elogio. Ela correu até Harry, mas seu corpo, frio, não reagiu. Ela podia ver alguns colegas deitados sem vida no chão, próximos de soldados presos no gelo. O professor não estava em lugar algum. Ela precisava correr.

A sada dos fundos era um corredor estreito repleto de curvas, e ela podia ouvir os gritos de ameaça do caça-magos diminuir à medida que se afastava. Depois de inúmeras curvas, ela encontrou uma escada curta que levava a um beco ao ar livre, já fora da universidade. Juliette não viu o céu por muito tempo antes de ser puxada para trás atrás de uma pilha de sacos de linho:

"Fique baixa e silêncio!" - Ela era encarada por enormes olhos brancos que contrastavam contra a pele negra de uma garota adolescente.

Ela acabara de ver a verdadeira maldade nos olhos do caça-magos. Nos olhos que estavam em sua frente agora, ela podia confiar. Ambas ficaram abaixadas e em silêncio, quando um soldado passou correndo por elas. Um momento depois, um virote de besta atravessou o peito do soldado, que caiu sem muito barulho.

"Agora, vamos!" - Ordenou a adolescente. Depois que começaram a correr, Juliette entendeu que ela não era uma adolescente: sua salvadora era uma mulher Fae na casa dos vinte, cuja altura chegava, no máximo, aos trax de Juliette.

"Quem é você?" - Ela perguntou. Enquanto corriam, ela podia ver silhuetas de pessoas nos telhados, a maioria envolta por capas verdes e marrons escuras.

"Não há tempo para isso! Devemos correr quão rápido quanto pudermos até chegar a um ponto seguro!"

"Quantos!?"

"O que você quer dizer?"

"Quantas pessoas saíram antes de mim?"

"Você é a quarta!"

Juliette parou em choque. Ela não podia acreditar que, além de Harry, ela pode ter perdido outros três companheiros e o professor. Isso não podia estar acontecendo.

"O que aconteceu?" - Perguntou a Fae, tentando fazer Juliette se mexer.

"Temos que voltar... não podemos deixar todos morrerem!"

"No podemos nos arriscar!"

No que Juliette ameaçou voltar, elas ouviram gritos. Os soldados já haviam encontrado seu colega cado e estavam invadindo os becos em busca dos responsáveis. Não havia volta. Juliette foi puxada pelo braço, e correram por alguns minutos, até a Fae diminuir o ritmo e começa a falar.

"Sabíamos que Sol estava prestes a fazer algo dentro do campus da universidade… decidimos ver o que estava acontecendo e encontramos seus colegas por acaso." - Explicou a Fae, mas a explicação havia deixado Juliette ainda mais confusa.

"E quem são vocês, afinal?"

"Insurgência! Resistência! Rebelião! Não faço ideia! Ainda não escolhemos um nome!" A Fae respondeu com um sorriso no rosto. Eles estavam fora de perigo. Assim que ela parou de falar, se virou para entrar em uma taverna onde se encontraram com os outros 3 acólitos sobreviventes e meia dúzia de insurgentes.